quinta-feira, 31 de março de 2011

A VIDA POR UM IDEAL

A VIDA POR UM IDEAL

Sady Ricardo dos Santos


Há algum tempo, a Rede Globo de Televisão apresentou uma série denominada “anos rebeldes”, abordando com extrema sensibilidade a luta dos jovens imbuídos do ideal socialista, principalmente na fase da instalação da ditadura militar no ano de l.964 no Brasil. A série me tocou fundo porque praticamente vivenciei todo aquele período. Existia  na época,  um clima que emergia no país e que fazia com que os jovens acreditassem nas propostas socialistas embasadas nos princípios da teoria Marxista.
Havia muita pureza, em todos os participantes destes movimentos e principalmente um forte  ideal reunindo  as classes estudantis. Naquelas  reuniões encontravam-se tanto jovens estudantes dos cursos científicos (atualmente o colegial), como também das áreas de engenharia, direito, medicina e tantas outras. As reuniões eram sempre  levadas  muito a sério e geralmente realizadas em locais simples, como casas nos arrabaldes da cidade, reunindo moças e rapazes num ambiente onde o  respeito e o ideal eram a tônica dominante.
A maioria dos participantes, quando efetuava algum pronunciamento sobre os assuntos discutidos, quase sempre determinava profunda  emoção nos presentes,  não somente pela forma dos discursos, como principalmente pelo brilhantismo, profundidade e conclusões a que chegavam. Abordavam na época basicamente uma linha política semelhante à do partido dos trabalhadores, o PT, quando na oposição ao governo Fernando Henrique e que infelizmente depois de assumirem o governo sob a presidência de Lula, a cúpula do PT acabou sendo denunciada pelo deputado Roberto Jefferson de corrupção, formação de quadrilha, fraudes e mentiras de todo o tipo, além um suposto “mensalão” cuja comprovação fez cair  toda a cúpula do planalto incluindo ministros, deputados e outros, ficando então desmoralizada toda a equipe que comandava a estrutura do  planalto do governo Lula.
Quando em l964 os militares tomaram o poder e implantaram a ditadura no Brasil, todos os esquemas que lutavam pelas liberdades populares foram desbaratados. Militares entravam nas casas de supostos comunistas, destruíam as bibliotecas mesmo que os livros encontrados fossem relativos a outros assuntos. Lembro-me de um fato até certo ponto curioso, que ocorreu com meu sogro o médico  Dr. Jorge Karam.
1          O Dr. Karam como era conhecido   e que por  diversas vezes em  razão  dos seus ideais socialistas, foi  recolhido preso  nos  quartéis, era além de um médico de inigualáveis qualidades e uma fantástica pessoa humana, um notório filósofo.
 Uma  certa noite, um tenente e dois soldados entraram na casa dele e foram imediatamente para a biblioteca. Jogavam rapidamente  os livros em um saco de aniagem, quando  lá pelas tantas o tenente levantando  a voz  como se houvesse achado a chave do reino bradou: ah, ah! Vejam, disse aos soldados. Esta é a bíblia destes comunistas – “A capital”. O Dr. Jorge com a calma e a tranqüilidade que lhe era peculiar disse educadamente ao tenente: tenente, este livro  “A capital”  é uma obra histórica. O livro de  Karl Marx  sobre o comunismo é “O capital”. O tenente meio avexado retrucou: é... mas vai assim mesmo.
O período da ditadura foi na realidade cruento. Jovens, entusiastas de um regime socialista que viesse a  melhorar a qualidade de vida com mais  saúde,  maior oferta de empregos e uma vida mais digna para as pessoas, eram espancados, levados aos trancos e barrancos  às prisões em camburões fechados. Defendiam a luta  da grande massa de  operários e dos camponeses, contra as minorias capitalistas que continuam   ainda  nos dias de hoje, formando  fileiras que bloqueiam  o desenvolvimento de uma sociedade igualitária, onde hajam  menos pobres e oprimidos e menos ricos opressores.
 Uma grande parte deles, após interrogatórios com o uso de aparatos sofisticados de tortura, repousa até os nossos dias em valas comuns em locais desconhecidos.
Torturados,  sufocados e reprimidos em seus anseios de liberdade, os nossos estudantes, amigos, parentes e colegas permaneceram até o fim da ditadura, amordaçados pelo truculento regime de exceção, que manchou indelevelmente de vermelho o nosso pendão verde e amarelo.
No silêncio de um passado de tristes recordações, onde jazem  estes idealistas que  lutaram pôr um mundo melhor, guardaremos  por todas as nossas vidas esta magnífica  lição de amor, coragem e patriotismo,  revivendo  em nossos corações o heróico episódio  destes nossos meninos que se doaram por um país com mais liberdade e uma vida mais digna para todos nós..

Sady Ricardo dos Santos
Irmão Acadêmico da Academia de Cultura de Curitiba
Autor dos livros Viva mais e melhor
e da coletânea - Crônicas GAZETA DO POVO.
“O carrossel da vida”.

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